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PARCERIAS

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I Quatro e meia da manhã, o jornal que tampa o buraco na janela rasgou, está frio, a esposa se contorce na cama sem acordar. Ele tem de dar um jeito naquele buraco. Aquela noite estava perturbada, e não deveria. Havia escolhas importantes para o dia que sucedia. Colocou uma porta do guarda roupas que estava solta em frente à janela e cobriu a esposa com mais um cobertor. A calma voltou para ela. Frio, muito frio, as botas que calçava eram as do canteiro de obras, teve de usá-las logo ao levantar-se porque não havia encontrado, na busca ali no canto embaixo da cama, o chinelo velho, único outro calçado que dispunha. Curioso o modo como se alegrava e entristecia repentinamente quando lembrava que aquele dia era o dia de pagamento. O mantimento acabou há três dias. O salário, embora insuficiente, sossegaria o espírito. II E espírito era o que o preocupava naqueles dias. Tudo estava “amarrado”. Numa outra noite de insônia, viu na TV, num programa da Igreja Universal, onde diziam haver enco

O encontro

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Movia as pernas freneticamente esperando o computador desligar, levantou-se apagou as luzes da sala e saiu. Era sexta-feira, cinco da tarde no horário de verão. Brasileiro já sofre pouco para se submeter a essa porra de horário, dizia. Fechou a porta e deu com a faxineira, Cuidado doutor o chão está molhado, bom fim de semana, Bom fim de semana, respondeu. Não sabia por que a faxineira lhe tratava como doutor, não era nada, fizera administração, mas nem administrador era. Fazia cena de chefe no escritório e se importava em manter o emprego apenas. Na verdade encenava demais e já estava cansando disso. Viu um amigo na sala ao lado, ignorou-o. O chão estava muito molhado, aparentava desperdício, porém não se preocupou. Quase conseguiu que o “Diretor de Assuntos Estratégicos” não o visse, perdeu importantíssimos quinze minutos com a conversa. Falaram das metas que alcançaram, dos objetivos da empresa e do desempenho de um empregado, ambos envergonhados da irrelevância dos assuntos para o

Canto Fronteiro

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O quarto é pequeno - 12 m² - ligeiramente bagunçado. Umas pilhas de livros sobre a cadeira, a maioria lida pela metade, uma velha TV no canto, à esquerda da janela de quem olha da porta, que está de frente. Na lateral direita um armário e uma cama encostados, parecem fazer parte de um conjunto se considerar a idade, mas os contornos e tonalidades são disformes. Abaixo da cama, além de sapatos e meias esquecidas, um violão silencioso. Na lateral esquerda estão uma mesa com computador e uma outra com uma máquina de escrever e alguns recortes de jornais e revistas. Os objetos da mesa com o computador em motim: copos, restos de comida e alguns trastes, coisa material. Um cheiro mórbido paira, ocupa densamente cada extensão da atmosfera ali presa. Este é o quarto de segunda-feira. Na quarta-feira, cinco dias antes, tem faxina, toda quarta-feira. Há sete anos alguém cuida do espaço e do homem, melhor, das coisas do homem: roupas, compras, pagamentos e etc. Uma empregada ou talvez uma parent